O silêncio dos Homens

Não se pode calar um pássaro, não se pode silenciar uma mulher.

Estas coisas não se devem revelar, dizem que o segredo é alma do negocio, mas também dizem tanta coisa, que no mínimo, dá-nos o direito de não acreditar em algumas. Vou escrever um romance com o sumo deste tema.

Decidi que precisava de me debruçar filosófica e socialmente sobre o silêncio dos homens. 

Muito para além da contagem numérica das palavras proferidas. Muito para além do cabo bojador de estarmos roucos de saber que as mulheres não poupam no léxico, mesmo quando não têm nenhuma ideia especialmente complexa para proferir. A voz chega-nos mais cedo assim como a maturidade. Mas sem estudo cientifico de suporte, seria só pura tentação, dizer que o atraso linguistico do género masculino está relacionado com os ganhos lentos de maturidade. 

Pronto. Já disse:)

Mas o “ele não fala” é um clássico. Tão ancestral que dá para pensar que eles só sairam da gruta para caçar porque não tinha nada interessante para nos dizer. 

A verdade é que a natureza maternal da mulher, o recato, o vinculo tardio da vida social, dava não só às irmãs Bronte e a Virginia Woolf, mas a todas nós, uma interioridade profícua de novelos de histórias, uma imaginação louca e uma vontade inata de contar, ao menos em sonhos, as coisas que nos impossibilitaram durante anos de viver. 

Os homens no salão de charuto, a medir pistolas e a conspirar guerras, e as mulheres relegadas à mesquinhice do tanque, do estendal, das panelas ou das rendas da corte. Esse silêncio imposto deu-nos a todas a nós, um dicionário de léxico que devia constar e ser homologado como o oitavo sentido. 

Um sentido que vem todo do sentir. 

Por isso, não seria nunca seria de estranhar que quando a liberdade de pensamento pede a mão à liberdade de expressão, se solte a língua.  

Como se a babel destruída fosse evocada na voz do ventre de todas nós.

Não se pode calar um pássaro, não se pode silenciar uma mulher. 

Já os homens. Comedidos no compromisso da palavra falada, ponderados no exagero gramatical dos ébrios, dominaram as palavras para o exercício bélico, da luta, do pacto e do negócio. Enquanto a terra girava, poucos foram os espécimes que se debruçaram sobre a mente das mulheres.

Indagando o que lhes iria no espirito, que não fosse para proveito de expansão sexual ou resgate emocional. 

A nossa capacidade de gerar vida, de dentro para fora, deu-nos um sentido de interioridade, de cuidado e nutrição. Percebendo no primeiro léxico imberbe dos nossos filhos todas as suas definições.

É um dom. Mas foi apropriada como uma maldição para a humanidade separatista, que definiu sem noção que cuidar era inferior a lutar. Que não há maior luta que a permanência do amor e que todas as mulheres, mesmo não sendo mães, o sabem de cor e salteado.

Que foi diabolizado quando algumas mulheres decidiram sair das fogueiras do silêncio para acabarem queimadas lá dentro. Com o ganho dos sentidos, veio o ganho dos sentires. E fomos expostas à emoção crua, permitindo gritos e urros sem estética, no epíteto de loucas. Mas nós somos isso, seremos sempre isso, carne, palavras e emoção. Emoção e palavras e cuidado e sentir. 

Não conseguimos divorciar-nos da nossa força de entender. Somos feitas de questões e aguçamos ainda mais o engenho, quando a vida nos secundarizou e nos mandou ir à caça das respostas que a sociedade nos negou. 

Confrontar um homem com os seus sentimentos é como pedir a Deus um porquê.

Está nos universais lacrados da ausência absoluta de resposta. Mesmo não sendo poupados aos tormentos, não foram instruídos na vulnerabilidade. À força de criar esperteza, e sentido prático, virilidade activa e e espirito combativo, encheram-os de verbo simples, curtos e sem adjectivação.

Criando um colectivo de bravos, feitos para o derrame do sangue, mas incapazes de verter de uma lágrima. Claro que daqui se ilibam os loucos, os bebâdos, os poetas, os libertários e todos os ilustres que usaram o cérebro para amplificar, divagar e criar.

E todos os outros homens, que as mulheres dizem raros, porque no verbo da criação, subtraíram sem querer todos os advérbios do feminino mais belo e mais puro. Mas eles existem e persistem. Não se tornam úteros, não precisaram de estimular ovários, nem leram exaustivamente as enciclopédias que nunca foram criadas para ensinar à humanidade masculina o que é uma mulher, interessaram-se porque determinaram que a inteligência do amor, dita a reciprocidade. E que a generosidade não tem género.

Falava-se antigamente dos dias em que os “animais falarem” mas a sociedade continua em dívida com o silêncio dos homens.

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• English Version

THE SILENCE OF MEN

You can't silence a bird, you can't silence a woman

These matters ought not to be disclosed, for it is said that secrecy is the soul of business, yet so many things are proclaimed that it grants us, at the very least, the right to disbelieve some of them. I intend to write a novel rich with the essence of this theme.

I have resolved to delve both philosophically and socially into the silence of men.

Far beyond the mere numerical count of spoken words. Far beyond the metaphorical Cape of Good Hope of knowing that women do not economize on vocabulary, even when they have no particularly complex ideas to express. Our voices, like our maturity, arrive earlier. Yet without scientific study to back it up, it would be merely tempting to say that men’s linguistic delay is tied to their slower gains in maturity.

There, I’ve said it :)

But the 'he does not speak' is a classic. So ancient it makes one ponder whether they only left the cave to hunt because they had nothing interesting to say.

The truth is, the maternal nature of women, their modesty, and the delayed bond of social life granted not only the Bronte sisters and Virginia Woolf, but all of us, a fertile interiority of story skeins, a wild imagination, and an innate desire to narrate, at least in dreams, the things that for years prevented us from living.

Men in the cigar lounge, measuring pistols and conspiring wars, and women relegated to the pettiness of the washbasin, the clothesline, the pots, or the courtly laces. This imposed silence gave all of us a dictionary of vocabulary that should be recognized and ratified as the eighth sense.

A sense that stems entirely from feeling.

Therefore, it should come as no surprise that when the freedom of thought joins hands with the freedom of expression, the tongue is unleashed.

As if the destroyed Babel were invoked in the voice from the womb of all of us.

One cannot silence a bird, nor mute a woman.

As for men. Reserved in their commitment to spoken words, measured in the grammatical excess of the inebriated, they have mastered words for the exercise of war, struggle, pact, and business. While the earth revolved, few specimens pondered the minds of women.

Questioning what might be stirring in their spirits, not for the sake of sexual conquest or emotional rescue.

Our ability to generate life, from within, gave us a sense of interiority, care, and nourishment. Discerning in the fledgling lexicon of our children all their definitions.

It is a gift. But it was appropriated as a curse for the separatist humanity, which defined, unawares, that caring was inferior to fighting. That there is no greater struggle than the permanence of love, and all women, even those not mothers, know this by heart.

This was demonized when some women decided to step out of the fires of silence only to be burned within them. With the gain of the senses came the gain of emotions. And we were exposed to raw emotion, allowing for screams and roars devoid of aesthetics, in the epitome of madness. But that is what we are, and always will be—flesh, words, and emotion. Emotion and words and care and feeling.

We cannot divorce ourselves from our strength of understanding. We are made of questions and sharpen our ingenuity even more when life relegated us and sent us hunting for answers society denied us.

Confronting a man with his feelings is like asking God why.

It is among the sealed universals of the absolute absence of response. Though not spared the torments, they were not taught vulnerability. Through the force of creating cunning, practical sense, active virility, and combative spirit, they were filled with simple verbs, short and without adjectivation.

Creating a collective of the brave, made for the spillage of blood but incapable of shedding a tear. Of course, this excludes the madmen, the drunkards, the poets, the libertarians, and all the illustrious who used their brains to amplify, wander, and create.

And all the other men, whom women call rare, because in the verb of creation, they inadvertently subtracted all the adverbs of the most beautiful and purest feminine. But they exist and persist. They do not become wombs, did not need to stimulate ovaries, nor did they read exhaustively the encyclopedias never created to teach the male humanity what a woman is, they were interested because they determined that the intelligence of love dictates reciprocity. And that generosity knows no gender.

It was once spoken of the days when 'animals would speak,' but society continues in debt to the silence of men."

E já agora, respondam-me faz favor: