Sinais de alarme que não fazem barulho
Uma proposta de conversa, para quem está mesmo convencida que TEMOS QUE FALAR
Há silêncios que fazem eco muitos anos depois.
Sobretudo na forma como se aprende a gostar de alguém.
Nem sempre percebemos quando um miúdo começa a sentir-se perdido dentro do que sente. Quando não entende porque é que não gosta como dizem que devia gostar.
Ou porque é que gosta de alguém que não gosta dele.
E, no desconforto dessa dúvida, pode nascer muita coisa.
Pode nascer empatia. Pode nascer frustração.
Pode nascer a aceitação de que ninguém nos pertence.
Ou a ideia de que, se não gostam de mim, há qualquer coisa de errado — em mim ou nelas.
A maioria dos homens que hoje agride ou controla mulheres, não começou aí.
Começou muito antes.
Nos pequenos silêncios.
Nas pequenas validações.
Nos códigos que se aprendem sem perceber.
Este não é um questionário para saber se o teu filho “é bom ou mau”.
Não é sobre julgamento.
É sobre ver para depois poder cuidar.
Sobre abrir janelas de conversa antes que a porta da empatia se feche.
Foi isso que me propus a fazer neste pequeno inquérito, que revi juntamente com uma amiga psicóloga, para conversar com os nossos filhos.
Não é um teste. Não tem pontuação.
Como é que tu vês as pessoas?
(Conversa para rapazes a partir dos 8 anos)
1. Imagina que um amigo teu tem uma amiga rapariga. Ela diz-lhe que está apaixonada.
Ele não sente o mesmo.
→ O que é que achas que ele deve fazer?
→ O que é que tu farias?
2. Um colega da escola diz que as raparigas não sabem jogar futebol.
→ Achas que ele tem razão?
→ Já viste alguma jogar bem?
3. Estás triste porque alguém de quem gostas está com outra pessoa.
→ O que é que sentes?
→ O que é que fazes?
4. Um super-herói tem de salvar alguém que o tratou mal.
→ Achas que deve salvá-lo?
→ Mesmo sem ouvir um “obrigado”?
5. Um amigo quer obrigar a namorada a apagar os amigos rapazes do telefone.
→ O que é que achas disso?
→ Achas que quem gosta manda assim?
6. Uma rapariga ganha-te num jogo.
→ Como é que reages?
7. Uma rapariga diz “não quero”.
→ O que é que isso quer dizer?
→ Há vezes em que “não” pode ser um “sim” disfarçado?
8. Se criasses um robot que soubesse amar,
→ O que ele nunca te podia fazer?
→ O que é que tinha de aprender primeiro?
Como usar isto
Esta proposta de diálogo, pode ser lido em voz alta, em tom de conversa, com curiosidade genuína.
O importante não é que “respondam bem”.
É que respondam com o que são.
E que haja espaço para escutar, perceber, corrigir — sem humilhar.
Isto não é sobre culpabilizar.
É sobre prevenir.
Porque é que isto importa
Não estamos à procura de sinais vermelhos.
Estamos à procura de espaços onde ainda cabe qualquer coisa boa.
Para que mais tarde, quando um amor lhe for negado, ele não o veja como um ataque.
E não precise de ferir para lidar com a perda.
Não é um interrogatório.
É uma semente.
E às vezes, o que salva uma vida, começa com uma conversa que ninguém achou importante.
Se este texto ajudar uma só criança a crescer com mais lucidez sobre o que é amar alguém — já valeu.
E se ajudar uma mãe ou um pai a perceber o que está a nascer no silêncio — é um favor à comunidade inteira.
Obrigada e partilhem
Isabel Saldanha
Isabel, isto é serviço público. Faço parte de um grupo de pais que se reúne mensalmente para discutir a paternidade e penso que este questionário é muito valioso. Para a desconstrução da violência de género, da misoginia. Obrigado 🫂